sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Uma nota sobre a distinção entre Determinismo e Fatalismo

Quero aqui ilustrar, através de um exemplo, a diferença entre o determinismo e o fatalismo. Quero fazer isto começando por uma discussão sobre a relação entre o determinismo e capacidade de prever o futuro. Veremos que devidamente qualificada a noção de previsão pode ser usada para explicar o determinismo – na verdade as duas noções podem ser entendidas, de um modo informal, como equivalentes. É na natureza desta qualificação que se pode encontrar um tipo de situação que distingue de forma decisiva e esclarecedora o determinismo do fatalismo.

A noção de previsão tem sido muitas vezes usada para explicar a noção de determinismo. Um dos exemplos mais notáveis é patente na famosa passagem de Laplace

“Devemos considerar o estado presente do universo como efeito do seu estado anterior e como causa daquele que se há-de seguir. Uma inteligência que pudesse compreender todas as forças que animam a natureza e a situação respectiva dos seres que a compõem – uma inteligência suficientemente vasta para submeter todos esses dados a uma análise – englobaria na mesma fórmula os movimentos dos maiores corpos do universo e os do mais pequeno átomo; para ela, nada seria incerto e o futuro, tal como o passado, seriam presente aos seus olhos”

Mas note-se que o conceito de determinismo é um conceito metafísico – diz-nos como o mundo é. O conceito de previsão é um conceito epistemológico – diz-nos o que podemos saber sobre o mundo. Reflexão sobre estes factos, por si só, deveria alertar-nos para possíveis equivocações. Basta lembrar, por exemplo, as confusões históricas entre, por um lado o a priori/ a posteriori e por outro o necessário/ contingente, que apesar de serem distinções, na epistemologia e na metafísicas, respectivamente, foram a dada altura entendidas erradamente como co-extensivas, isto é, o a priori co-extensivo com o necessário, e o a posteriori com o contingente.

Uma previsão é essencialmente um procedimento prático de se fazer observações e deduções dessas observações de acordo com regras estabelecidas – entre as quais se encontram as leis da natureza que as nossas melhores práticas científicas nos deram. Mas neste sentido, uma previsão não nos dá mais do que uma aproximação a um futuro estado das coisas, e isto por duas razões óbvias: (1) porque as observações que fazemos e que informam os nossos dados iniciais, são, por um lado imprecisas, na medida em que os nossos instrumentos de medida e a nossa capacidade de discriminação são limitadas, e por outro porque a quantidade de coisas que medimos é sempre circunscrita a uma região no espaço sem que possamos excluir a relevância causal do que está fora dela (a nossa capacidade de recolha de dados é muito inferior ao número de acontecimentos e objectos dentro do nosso cone de luz). (2) As deduções que efectuamos, mesmo com os melhores dados possíveis, dependem da qualidade epistémica das leis que constituem as várias ciências, sobre as quais temos muitas incertezas.
Assim as nossas previsões podem ser mais ou menos certas, dependendo da qualidade de (1) e (2) mas não nos podem dar certezas (e nem discuto sistemas caóticos mas deterministas, por exemplo) do estado futuro do mundo. O nosso conhecimento do mundo é compatível com vários futuros incompatíveis do estado das coisas.

Mas um Mundo é determinista se e só se, o estado do mundo num dado momento t0 fixa o estado do mundo em todos os momentos subsequentes, de acordo com as leis da natureza. Posto isto só há um estado possível das coisas, em cada instante. É claro então que a noção de previsão discutida acima não capta o que é fundamental no determinismo. Previsão neste sentido é compatível com o indeterminismo.
Por isso Laplace recorre a um ser de capacidade superiores, uma deidade, para que possa eliminar os defeitos de (1) e (2), de modo que este saiba com toda a certeza as condições iniciais do mundo e as leis da natureza. Por isso tem de se qualificar a equivalência entre determinismo e previsão do seguinte modo: um evento é determinado se é só se em princípio é previsível. A clausula “em principio” garante uma situação ideal na qual (1) e (2) são completamente satisfeitos.

Mas há uma segunda qualificação. A primeira, que acabamos de ver, depende da capacidade de conhecer dos agentes, a segunda qualificação depende do facto de que conhecer é uma actividade de um sujeito cognitivo. A questão que se põe aqui é a de saber se todos os agentes cognitivos podem ter acesso a este conhecimento, supondo que ultrapassaram o primeiro problema. Para ver qual é a dificuldade considere-se a seguinte experiencia mental:

Imagine-se que O. tem ao seu dispor um super-computador que satisfaz tanto (1) como (2) de forma ideal. Estamos a supor portanto que o computador consegue, dado o estado do mundo num dado momento t0 prever o estado do mundo em todos os momentos futuros, t1, t2, t3 etc. Assim O. poderia saber antecipadamente muitas coisas sobre o mundo à sua volta. Por exemplo, O. poderia apresentar duas ou mais escolhas a vários indivíduos e poderia saber antecipadamente qual a sua escolha.
Mas há toda uma classe de acontecimentos que ele, assim parece, não poderia saber antecipadamente, e por isso, que o computador não poderia prever. Para ver isto, suponha-se que O. decide imediatamente após apresentar o leque de opções aos vários sujeitos da sua experiencia, dizer-lhes qual vai ser a sua decisão. Isto é ele diz “Têm de escolher entre P, Q, R...Z, e tu aí (apontando) , eu sei, vais escolher Q, tu P ...etc.” .
Suponha-se contudo que entre estes há um, chamemos-lhe C., que tem por habito fazer exactamente o oposto que lhe pedem, sugerem ou exigem. C. tomando esta previsão como uma imposição à sua pessoa decide fazer consoante o seu hábito, e portanto age de modo diferente daquele que O. lhe apresentou como sua futura decisão. Portanto estamos a dizer que quando O. lendo o resultado da previsão do computador, informa C. como este vai escolher, C. escolhe uma outra opção. Mas agora, nesta situação, o super-computador, mesmo possuindo os dados todos antes da escolha e sabendo todas as leis da natureza, não consegue prever a escolha de C.. Mas note-se que a escolha de C. não deixa de estar determinada. Mesmo antes de C. vir ao mundo, só havia um estado possível do mundo, no momento da decisão de C. perante o leque de opções proposto por O., compatível com o estado do mundo antes de C. nascer. Assim temos um caso onde C. está determinado, mas o super-computador não consegue fazer uma previsão. Dado isto não há uma equivalência entre previsão e determinismo.

O que correu mal na formulação de uma equivalência entre determinismo e previsão neste caso é a possibilidade de interacção entre a previsão e certos actos de decisão acerca da qual a previsão se pronuncia. Um modo de evitar isto, e assim garantir uma co-extensividade entre determinismo e previsão, é que o agente que prevê esteja fora do mundo e sem possibilidade de contacto com este. Neste caso, a situação descrita é eliminada. Assim, podemos formular a equivalência deste modo: um dado mundo é determinista, se e só se, todos os acontecimentos do mundo são previsíveis, em princípio, por agentes fora do mundo.

Mas que tem isto tudo que ver com o fatalismo? A meu ver se há alguma noção de fatalismo apropriadamente diferente da noção de determinismo é a de que independentemente daquilo que fizermos, dos nossos esforços e vontades, há certas coisas que têm simplesmente de acontecer. Suponhamos que estava destinado que C. optasse por A, então não importa seja o que for que C. faça ou tente fazer, ele irá optar por A. A diferença entre um mundo fatalista e um mundo determinista é a de que num mundo fatalista, um deus que sussurrasse aos ouvidos de C. que este iria escolher A não deixaria de ser um mundo no qual C. escolhesse A, por mais vontade e esforço que A pusesse em escolher outra coisa. Mas como vimos nada disto faz sentido num mundo determinista. Afinal, as escolhas e desejos de C. são tão causais como o resto dos acontecimentos à sua volta, e por isso o mesmo sussurro de um deus poderia levar a que C. agisse de outro modo se este o quisesse contrariar, como vimos anteriormente.

A diferença entre fatalismo e determinismo é a diferença entre a livre expressão das leis da natureza sobre as propriedades do mundo, de que as nossas propriedades mentais são parte, e a imposição de vontades divinas, diabólicas ou místicas, sobre as leis naturais. Sem a operação destas forças sobrenaturais não há razão para pensar que C. não possa decidir de outro modo quando lhe sussurram o que vai fazer. Pensar o contrário é supor que algo para além das forças naturais está em operação para que C. não possa exercer a sua vontade.
Haverá uma certa naturalidade em dizer que num mundo determinado todas as decisões e actos de todos os agentes vão ter de acontecer de certa e determinada forma, e por isso que cada um tem um destino especifico à sua frente. Não veja nada de errado nisto, se estamos a falar correntemente, mas convém notar que há uma distinção a fazer em relação ao que acontece devido às leis naturais, e o que acontece com intervenção sobrenatural. É esta distinção que eu quero realçar e cujas implicações estão patentes na experiencia mental discutida.

11 comentários:

GUST99 disse...

O exemplo mental está mal colocado .
O super computador conhece as particularidades de cada agente e sabe que um determinado agente vai responder ao contrário da escolha alvitrada .
O facto de "normalmente" não se poderem fazer previsões por impossibilidade de conhecimento de todos os dados apenas traduz a nossa ignorância e limitação .
A questão relevante a tomar em conta é que cada um de nós age em função de parâmetros muito complexos muitos dos quais não conhecemos mas que apesar desse desconhecimento a acção não deixa de ser realizada .
Quando observamos o acto de outro (cada um de nós é um outro apenas mais próximo),apenas podemos observar a culminação de um processo complexíssimo do qual não percebemos o funcionamento .
Somos uma máquinas altamente sofisticada que foi posta a funcionar quando nascemos e que , estando sujeita a upgrades contínuos , tem a capacidade de em interacção com o meio que a envolve mudar o firmware duma forma muito significativa .
O facto de se formarem muitos firmwares diferentes implica que os outputs dos mesmos inputs possam ser diferentes .
Eu falei em capacidade de em interacção com o meio de mudar o firmware .
Mas quem é o agente , o “responsável”, dessa mudança ?
Para mim , não há agente , não há “ninguém” “responsável” , trata-se de um processo automático que as várias psicologias e neurociências apenas começam a tentar compreender .
Para a grande maioria das pessoas “eu”(o que quer que isto signifique) serei o técnico responsável pela actualização do dito firmware .
“Eu” terei a “liberdade” de fazer isso ou não , terei “vontade” de decidir que o meu actual firmware é “bom” ou não é “bom” e mudá-lo em consequência .
Nós apenas podemos observar o resultado do funcionamento do firmware e tentar compreender algumas partes das rotinas de programação , mais nada .
Se essa observação é operante num sentido ou noutro , e penso que será , não será este facto motivo para discriminar “moralmente” em termos de “responsabilização” as pessoas .
Como já disse noutra altura , a linguagem reflecte de forma insidiosa os paradigmas existentes .
Há que descodificar esta mesma linguagem , mostrando a sua justificação apenas para paradigmas velhos a ser ultrapassados .
Gustavo Ferreira

Miguel Amen disse...

Olá Gustavo

Repara, estamos a assumir que o computador sabe tudo, por isso ele também sabe os meus estados mentais, e em particular sabe que eu neste momento posso querer contraria-lo. Não há qualquer dúvida nisso. Também parece plausível, visto que ele sabe tudo que é relevante, que possa prever todos os meus estados futuros. A razão da experiencia é mostrar que ele sabe estas coisas desde que as minhas futuras decisões não me sejam dadas a conhecer. Se ele me diz que eu daqui a um minuto vou escolher A e não B e eu tenho o desejo de o contrariar, então é muito provável que consiga fazer B e assim o super-computador não consegue prever o que eu iria fazer. Não importa que ele saiba que eu quero fazer o contrário. Ele quando me diz, como resultado da sua previsão, o que eu vou fazer, tem de dizer um estado concreto do mundo, e em particular qual vai ser a minha decisão. Mesmo, algo absurdo, que ele me diga que eu vou escolher A, mas como sabe que eu o quero contrariar e portanto vou escolher B, então parece, desde que ele me diga tal, e PORQUE eu o quero contrariar, que vou escolher A. E assim, em nenhum destes casos, a partir do momento que ele me informa o que vou fazer, pode de facto prever o meu futuro.

O Gustavo tem razão quanto à questão do que nós podemos saber ou não acerca de nós e das leis da natureza para poder efectuar uma previsão. Por isso a previsão tem de ter um qualificativo de “em princípio”. Mas estas coisas estão todas lá explicadas.
Abraços,
Miguel Amen

Vitor Guerreiro disse...

Isso parece ter consequências para o conceito de omnisciência: um ser exterior ao universo só pode ter omnisciência se não intervir no mundo. Caso contrário, haverá sempre coisas que não pode prever. (em sentido próprio, um ser omnisciente não "prevê", mas "sabe").
Contudo, o ser omnisciente proposto pelas diversas teologias é um ser interventivo, que põe as mãos no mundo, logo, está na mesma situação que o supercomputador.

A doutrina cristã tem sido defender algo semelhante a isto: "apesar" de o computador saber que o sujeito vai escolher B para o contrariar, a "profecia" que sai da máquina será A porque essa seria a forma de preservar o lívre arbítrio do sujeito. O que para mim não faz sentido algum.

Miguel Amen disse...

Caro Zalmoxis,

No meu exemplo, em nenhum dos casos se preserva, de forma clara o livre-arbitrio: quer o computador consiga quer não consiga prever o futuro (como quando me diz o resultado da sua previsão). O incompatibilista, tal como eu, pode concordar com tudo o que é dito na entrada original, sem que por isso o agente tenha qualquer livre-arbítrio. O que é dito é tão somento uma consequencia do determinismo.

Miguel

Vitor Guerreiro disse...

Sem dúvida. É por isso que a doutrina cristã não me convence.

A mera possibilidade de fazer uma escolha diferente não significa que a minha escolha não seja determinada.

O que me chamou a atenção foi o facto da argumentação parecer minar o fatalismo (causalidade sobrenatural) e não apenas distingui-lo do determinismo. Um ser tal como concebido pela teologia estaria condenado a não poder intervir no mundo sob pena de não poder prever o que fariam os agentes desse mundo.

abraço

Miguel Amen disse...

Caro Vitor

Estritamente falando um ser sobrenatural poderia intervir no mundo, dizer-nos o que iriamos fazer ou decidir, e no entanto saber exactamente o que iriamos fazer, pois ele teria "forças" tais que nós não deixariamos de fazer o que ele sabia que iamos fazer. Isto é, ele podeia forçar-nos a manter um certo caminho, a realizar um certo distino. Isto seria fatalismo. Mas aqui também é claro que não temos livre-arbítrio, de uma forma óbvia, na medida em que o ser sobrenatural nos força a algo, ou a um destino. Parece que ele não pode ter tudo.

Vitor Guerreiro disse...

Entendo. Mas isso seria o equivalente a imaginar que o supercomputador descrito no post teria o poder de forçar o sujeito da experiência a optar segundo a sua previsão. O que acontece nesse caso não é a impossibilidade do deus prever o que faria o sujeito em circunstâncias normais (onde a causalidade sobrenatural não intervém, se deus se limitasse a uma intervenção semelhante à do computador) mas apenas a possibilidade dele obrigar ad hoc o curso das coisas a seguir o seu capricho.

Claro que é precisamente para isto que me alerta ao dizer-me que um ser sobrenatural pode sempre obrigar-nos a escolher de certa forma. É isso que distingue o fatalismo do determinismo. A causalidade sobrenatural impor-se-ia quer sobre um mundo determinista quer sobre um mundo indeterminista.

Mas o que eu estava a pensar era mesmo nesta nuance: não é que o argumento não coloque de facto um problema ao conceito de omnisciência, é como se eu tivesse o poder físico de obrigar o meu vizinho a comprar o jornal num quiosque x, mas continuasse a fazer sentido dizer que eu não saberia o que ele iria fazer, onde compraria o jornal, caso eu me abstesse de o coagir. Quero dizer, haveria uma "região do pensável" que eu (ou um deus que vende jornais) não poderia abarcar pelo meu pensamento caso abdicasse de fazer violência sobre o real, o que parece contrariar a omnisciência em sentido forte.

Claro que isto por si não desaloja a ideia de causalidade sobrenatural, ela não é inconsistente em si mesma. Mas parece dar algumas chatices à ideia de uma causalidade sobrenatural omnisciente, o que já não é mau.

abraço

Vitor Guerreiro disse...

... Basicamente, estou a dizer que a sua última resposta substitui a omnisciência pela omnipotência. Como se a segunda se fizesse passar pela primeira. Coloca a omnipotência a disfarçar uma ausência real de omnisciência. Se eu souber o que o meu vizinho vai fazer só porque o vou obrigar a agir de certo modo, isso seguramente indica um poder que eu tenho de o obrigar, mas não um poder real de saber tudo o que há para saber sobre o seu modo de agir.

Contudo, o tema da omnisciência é lateral ao propósito do post, pelo que peço desculpa.

Miguel Amen disse...

Concordo com muito do que diz Vítor, excelente comentário. Só quero acrescentar o seguinte. O argumento original foca a decisão, que penso ser o lócus natural do livre-arbítrio. É na iteração entre a previsão da minha decisão e um momento anterior à minha decisão que o problema surge. Porque não posso eu fazer diferente? Mas se não houver esta interacção não vejo problema maior. O deus do quiosque poderia saber tudo acerca de mim, e em particular se eu ia ou não comprar o jornal hoje e a que horas, etc, desde que não me informasse dessa minha futura decisão (assumindo que ele não queria usar os seus poderes para me forçar num certo caminho, caso contrario poderias “prever” tudo, mesmo que me informasse da decisão).

Parece que se ele me informa, perde a sua omnisciência, e para não perder a sua omnisciência, não me pode informar da minha futura decisão, e então parece perder a sua omnipotência! Uma situação delicada e limitativa para deus ponderar.

Abraços,
Miguel

Vitor Guerreiro disse...

O problema de maior não está numa omnisciência não-interventiva, mas em todas as doutrinas teológicas que postulam uma omnisciência interventiva (o único tipo de omnisciência que interessa à teologia que não prescinde da omnisciência em prol de outros atributos do deus).

A omnisciência seria uma capacidade precária a menos que o deus fosse como um universo separado, com o qual não conseguiríamos comunicar (nos dois sentidos). A partir do momento em que a interacção fosse possível, a omnisciência estaria comprometida.

Por outro lado, todas as teologias postulam um acto singular de interacção que poderia comprometer tudo: a própria criação. Parece que a decisão de criar um universo determinista ou indeterminista já implica uma intervenção suficiente para comprometer a omnisciência.

Afastando-nos agora da omnisciência: se o deus interviesse de maneira a obrigar-nos a optar, fá-lo-ia de modo que sentíssemos esse constrangimento ou de modo que não o sentíssemos. No segundo caso, do ponto de vista do sujeito, parece tratar-se da mesma relação que existe entre o determinismo e a capacidade de escolhas diferentes ou como o exemplo de um militante obtuso que não tem consciência de não agir autonomamente mas sim em função de uma lavagem cerebral.

Neste caso, creio que o exemplo do fatalismo seria algo como a prisão de um indivíduo num regime ditatorial: o facto de o ditador prender pessoas não significa que elas não tenham capacidade de escolha, é precisamente por elas terem capacidade de escolha que o ditador sente necessidade de as prender. Em ultima instância, o que esse ditador pretende prender não são indivíduos, mas sim o curso da história. Mas isto significa que a história tem o poder de contrariar a fantasia dos ditadores. O sobrenaturalismo limita-se a imaginar uma fantasia de ditador que é impermeável à força maior da causalidade histórica (natural).

Miguel Amen disse...

O Christopher Hitchens em "God is Not Great" demora-se na imagem de deus como um ditador supremo, e não percebe como se pode encarar tal deus como uma coisa boa. É uma boa imagem para aqules ateistas ou agnósticos que dizem que deus não existe (ou não sei se deus existe ou não) mas seria bom que existisse.

Miguel