sexta-feira, 23 de março de 2007

Porquê escrever um blog?

A revista ‘The Philosophers’ Magazine’ recentemente incluiu um artigo em que se aborda este tema, onde é citado o editor a dizer que

“Given that the world probably does not even need most of my more carefully worked out musings, it certainly doesn’t need my off-the-cuff ramblings. So, no, sorry. Blogging would waste my time and yours. Go read something I or someone else has put some prolonged thought into.”

É o tipo de ideias que até à pouco eu partilhava inteiramente, e motivo pelo qual raramente lia blogs ou levava a sério a ideia de escrever um. Parece-me que a maior parte do que se publica não merece o nosso tempo de leitura. As minhas ideias mudaram ao ler o seguinte no Blog de Brandon Watson, Siris

“I consider blogging to be a very informal type of publishing - like putting up thoughts on your door, with a note asking for comments, or like brainstorming sessions. Nothing in this weblog is done rigorously: it's a place for jottings and first impressions. Because I consider posts here to be 'literary seedings' rather than finished products, nothing here should be taken as if it were anything more than an attempt to rough out some basic thoughts on various issues. Learning to look at any topic philosophically requires, I think, jumping right in, even knowing that you might be making a fool of yourself; so that's what I do. My primary interest in most topics is the flow and structure of reasoning they involve rather than their actual conclusions, so most of my posts are about that. If, however, you find me making a clear factual error, let me know; blogging is a great way to get rid of misconceptions.”

Chamou-me a atenção especialmente a noção de que os posts são “literary seedings”. Foi esta ideia que me decidiu a avançar com o blog.
O que se vai encontrar aqui são pequenas notas de reflexão sobre os temas filosóficos que me ocupam no momento, com vista a compreende-los melhor. Muitas das ideias expressas serão meras tentativas, um momento de brainstorming. Mas a ideia é expressá-las claramente, sucintamente e sem tecnicismos. Mas mesmo que a maioria não dê em nada, talvez algumas floresçam. Não há outra maneira de fazer filosofia.

Claro que poderia escrever para uma pasta qualquer escondida num cantinho do computador; Mas não se pode negar o apelo e a utilidade (caso o leitor comente os posts ou me escreva por email) de ser lido.

4 comentários:

gusgus azul disse...

Também já tinha pensado sobre sobre a essência e a existência dos blogs .
Partilho inteiramente o que foi dito na inauguração deste blog e poderei acrescentar que me sinto feliz por encontrar genuinos companheiros de jornada perplexos perante a condição humana e dispostos a uma aventura milhares de vezes tentada sem sucesso.
Sou dos que penso que não "quero"
esta aventura mas que esta aventura impõe-se-me "naturalmente" .
O projecto sobre o que fazer ou refazer em relação às suas conclusões sobre a impossibilidade do livre arbitrio ,será revolucionário .
Toda a cultura , todos os preconceitos ou mal-entendidos de civilizações atràs de civilizações ,serão colocados àluz do dia e novos paradigmas surgirão .
E para já fico-me por aqui .
Em breve a aventura continuará ,aliàs ,os pensamentos não param e basta existirmos para estarmos na aventura .

gusgus azul disse...

Antigamente hà muitos séculos ,não importa precisar no tempo, os homens viam-se confrontados e ficavam perplexos ao pensar sobre a condição humana (veja-se por exemplo o Eclesiastes da biblia ) .
Observavam o sofrimento e a morte e a aleatoriedade do que acontecia ao homem sem qualquer explicação .
Em todos os tempos , os lideres tinham de demostrar que mereciam a posição e o bem mais precioso que tinham para oferecer seria o conhecimento que atenuaria ou apaziguaria as angústas e dúvidas dos seus subordinados . Essa oferta ,além de ser um sinal seria uma exigência do seu elevado estatuto .
Para simplificar , vamos ao génesis , o ponto de partida para a modelação do espirito dos homens ,mais concretamente os de cultura judaico-cristâ .
Foi construida uma explicação do mundo e do homem que hoje passados tantos anos ainda vale para muita gente .
Quais são as ideias chave dessa “história” ?
O homem , o cume da criação , foi criado imortal e vivendo da melhor vida que se podia imaginar .
Deus não poderia ter feito o ser imperfeito e mortal que entretanto estava à vista de todos . Então o que se passara entretanto ? quem seria o responsável por essa mudança .
Tinha que haver uma explicação .
E quem melhor do que a autoridade de deus para garantir a autenticidade da explicação.
Não sendo deus a explicar directamente às pessoas , serão os lideres , dignos de ser escolhidos por deus a transmitir essa explicação .
Seria o livre arbítrio , propriedade fundamental do ser humano aquando do sua criação em glória , que permitiu a sua responsabilização , a atribuição de uma culpa e o respectivo castigo . Não podendo ser atribuída a deus a responsabilidade da condição da miséria humana só restava como culpado , o próprio homem , e o castigo , a sua própria condição.
É claro que nesses tempos já existia a noção de capacidade de escolha do homem , a capacidade de o homem escolher obedecer ou não às regras(livre escolha ) ligada à sua responsabilização com vista à atribuição de castigos ou méritos .
Portanto Deus tendo dotado o homem de livre arbítrio e tendo estabelecido regras , houve a desobediência às regras com a consequente atribuição de culpa e castigo ..
É de notar a imprescindibilidade da existência desta qualidade do homem (livre arbitrio)
para que a “história “ seja credivel .
E o resto é sobejamente conhecido .O homem escolheu , foi responsabilizado e culpado dessa escolha e severamente castigado com o sofrimento a miséria e a morte .
O homem entretanto foi pensando que Deus não podia ser assim tão bera e vai dai mais uma “grande história “ em que o homem terminará por ser “salvo “.
Nesta grande história surge de novo a interessante questão (em aberto , para quem construiu a história que , não se sabe bem quem foi ) de o homem ter que escolher (o quê ? ) para ser salvo ou se alguém (Deus) lhe oferece a salvação e ele só terá de escolher aceitar ou não .
O processo repete-se . Num primeiro tempo , o homem tinha a possibilidade de escolher mal não cumprindo as regras e dessa maneira o fez , num segundo tempo , foi-lhe dada novamente a possibilidade de escolher repor a sua situação original cumprindo as regras ou não , e aqui temos deus à espera do homem , de cada homem para lhe fazer o quê ? desta vez !!. O homem não podia ter sido constrangido a desobedecer às regras , pois assim não seria culpado e consequentemente não poderia ser castigado e ainda hoje se calhar , continuaríamos sem ter explicação para a morte e o sofrimento . Qual a causa , qual o motivo que poderia ter levado o homem originalmente perfeito a desobedecer às regras ?
Com este resumo , muito sintético , pretendo dizer que a principal religião do mundo e não só , construiu e ainda hoje baseia , tem como alicerce principal para a sua afirmação e consistência , a célebre e universalmente incontestada livre escolha humana .
Quem “inventou “ que o homem escolheu a sua perdição , portanto escolheu mal , inventou que o homem continua a poder escolher como o primeiro homem obedecer ou não a determinadas regras (outras) sendo igualmente julgado e castigado ( como? Em que termos? ) .
Crime culpa e castigo serão conceitos utilizado desde os primórdios da civilização humana e revelaram-se desde sempre de grande utilidade na vivência em sociedade .
Dada a grande variabilidade dos comportamentos humanos , e a necessidade para uma
“normal “convivência humana de balizar ou limitar alguns desses comportamentos ,
foram criadas regras .
Para estes conceitos serem utilizados têm que estar ligados como a outra face da mesma moeda , ao livre arbitrio .
Nos animais os comportamentos são ditados por instintos inatos e aprendisagem .
Eles não têm escolha . Um cão , por exemplo , não pode decidir morder ou matar uma pessoa ou não morder ou não matar .Ele age como resultante dos múltiplos parametros
de uma máquina perfeitamente determinada . Nós , como observadores , podemos desconhecer alguns desses parametros mas não duvidamos que eles estão lá (mesmo que não saibamos definir esses parametros ) .
No caso humano passa-se precisamente a mesma coisa .A pequena diferença que “intuitivamente “ foi considerada como uma diferença radical , é que o homem pode demorar uma eternidade a decidir comportar-se de uma determinada maneira , em ligação
com as múltiplas e complexas rotinas inatas e adquiridas de que o seu cérebro se serve para agir .
Durante esse tempo , antes de um determinado comportamento , decisão , o homem tem a capacidade de observar as várias alternativas que se lhe apresentam para agir .
Considera-se comummente que alguém que tomou uma atitude deixou de tomar outras atitudes que eram “igualmente “ possíveis .
O animal não observa as suas várias opções e como tal não pode “fazer juízo “ sobre elas , ele simplesmente munido dos seus instintos inatos e ou adquiridos mais as circunstâncias do momento , age .
Ora é esta capacidade de fazer cálculos elaborados sobre as várias hipóteses de acção ,
isto é “fazer juízo “ sobre elas e , no fim desses cálculos , adoptar uma e , o pressuposto de que haveria “igual “ possibilidade de ter sido adoptada uma outra hipótese de acção , que “ intuitivamente “, dará origem à noção de livre escolha .
Há a ilusão de que um individuo pode “igualmente “ adoptar um comportamento
ou outro , visto que finalmente pôde “escolher” e , “naturalmente “ , ter mérito ou
demérito por essa atitude .
Podemos falar em ignorância das causas que afectam o nosso comportamento ou ,o
que é o mesmo , apelidar de escolha ao processo complexíssimo que determina que
numa determinada situação um determinado indivíduo se comporte de uma determinada
maneira .
Quanto mais profundamente observamos os vários processos determinantes das nossas acções , mais o livre arbítrio nos parece uma abstracção sem significado no mundo real .
O homem não escolhe aquilo que é ,ele é o fruto do meio envolvente que o modelou (genes e cultura e as circunstâncias )
Digamos que o homem é o único animal que afirma ( com orgulho , ainda por cima )que podia ter feito algo que não fez ou então , dito de outra maneira , eu só decido aquilo que
escolho decidir .
E todos somos ensinados nesta santa ignorância , até quando?
Mas quem , por acaso , tenha começado a perceber que o homem é um ser maravilhosamente determinado como todos os outros animais , onde está a sua glória?
Se calhar tenho um principio de resposta , outros avaliarão , mas para já fica a pergunta .


( As palavras entre aspas apenas significam que não quis perder tempo a rebuscar outras palavras , para já foram estas que saíram . podem sempre ser reformuladas ou mesmo apagadas .)

marcia adriana disse...

Sim , real/te não se pode negar o apelo e a utilidade caso alguém venha a comentar e ler seus posts. E acho q vc está certíssimo. Poderia colocar suas idéias em uma pasta sim, mas ali com certeza não haveria chance alguma de acontecer nada com elas, nem mesmo o prazer ver alguém ter algum argumento contra e interessante. Quer algo mais estimulante do q escrever algo e no dia seguinte ver um monte de comentários contra o nosso. Acaba sendo um espaço pra debates e quem gosta de filosofar geral/te gosta disso tb. Eu , por acaso dei uma passada por aqui e gostei muito, virei mais vezes. Está ótimo.

Miguel Amen disse...

Obrigado pelo comentário Marcia.